terça-feira, junho 26

Um posto

A velhice é um posto. E ter o prazer de ouvir estórias de quem muito viveu, como é o caso do Ti' Zé Leiteiro do Alqueidão, é um privilégio. Descamisadas, onde o povo se reunia e convivia ao fim de semana a limpar o milho ("na quinta onde agora é o Intermarché, ou lá o que chamam àquilo"), cantando e bebendo até as forças aguentarem; dias de trabalho com 18 horas de duração; percorrer centenas de quilómetros de bicicleta a distribuir leite e batatas; dar o primeiro beijo à esposa apenas após o acto do casamento estar consumado... Enfim, o mundo que não há muito tempo atrás era Portugal e que hoje parece tão irreal e distante, contado por quem tem "84 anos de vida, mas 200 de trabalho". Através de momentos como aquele que passei ontem de tarde é, de certa forma, garantida a conservação das memórias das tradições e costumes que o tempo teima em apagar. As pernas podem já estar a ceder-lhe, Ti' Zé, mas a cabeça tá em melhores condições do que a de muita gente bem mais nova que você. Aqui fica o meu bem haja e tributo a um símbolo vivo da tradição Portuguesa em geral e do Concelho de Ourém em particular.

8 comentários:

tiagogoncalves disse...

Ainda este fim-de-semana, numa conversa entre amigos, insistia na nessidade de um espaço onde etnografia oureense tivesse o destaque e o tratamento merecido. Para quando um museu sobre as nossas gentes? até podia ser integrado no tal museu do vinho medieval que alguém queria fazer no Castelo...não?!

quando poderes desfolha o livro:
Memórias etnográficas do concelho de Ourém, se é que não o desfolhaste já. deve de estar na biblioteca municipal.

fica bem

Anónimo disse...

Há quantos anos... O Sr Zé Leiteiro é do que mais me lembro dos meus primeiros anos de vida. Todos os dias passava por minha casa e lá deixava a dose natural de leite. Como era um apreciador da coisa, sempre que o Sr Zé se atrasava (contam os meus pais) chamava-lhe PPD, comunista e fascista. O Sr Zé Leiteiro vai ficar para sempre na minha memória e, certamente na memória de tantos a quem trouxe de beber. Obrigado Ric Jo por me/nos trazeres memórias tão boas.

Paulo Gonçalves disse...

É o meu vizinho pá! É o homem mais rijo que conheço, muitos são os dias em que anda de tronco nú em pleno inverno!
É um porreiraço, e gosta de beber uma boa vinhaça ou umas minis para manter a forma lol.
O Sr Zé é que produz o verdadeiro leite, é melhor do que o leite do supermecado com chocolate...

Ric Jo disse...

Obrigado Tiago, mas já tive a oportunidade de o desfolhar. A minha prima Sofia trabalha nos Castelos e já me forneceu uma vista de olhos. Gosto particularmente da parte visual do livro, ou seja das fotos. Muito bom.

O Zé Leiteiro é de facto um rijo. Um rijo que tem um legado de boas recordações e tradições! Uma das memórias mais antigas que tenho é o de os meus pais irem à porta de casa, aqui no Alqueidão, nas férias do verão, buscar o Leite do Zé Leiteiro para beber... lol. Muito bom.

tiagogoncalves disse...

De facto as fotografias são fantásticas. Na altura fiquei faxinado. gosto muito de fotografias antigas, naquele tempo a fotografia não estava banalizada como hoje, e aquele momento do disparo para o retracto de família, era tão importante como um casamento ou um baptizado de um filho. Nesses retratos as pessoas faziam poses forçadas, talvez... mas por ai, por esse lado fingido, dá para conhecer outros lados de cada um, que naqueles tempos, as dificuldades e contratempos da vida, não permitirão que chegassem até hoje de outra forma.
aqueles rostos dão para nos perdermos na nossa própria imaginação...quantas vezes não me perco a ver as fotos dos meus avós.. ;)

Anónimo disse...

Um grande homem! Sempre com um sorriso! E olhem que ele passou um mau bocado por causa de um aldrabão que o enganou já há alguns anos!

Anónimo disse...

Esqueci-me de assinar o comentário anterior.
Abraços,
Pedro Lopes

Anónimo disse...

Olá!
Já que o tema é a etnografia e as memórias das nossas gentes, não sei se tiveram oportunidade de assistir ao Concerto Etnográfico da Orquestra Típica de Ourém que se realizou na Pr. Mouzinho de Albuquerque. Uma boa forma de não esquecermos as nossas tradições! Se não foram, vejam as fotos através de:
http://orquestratipicaourem.blogspot.com/